sexta-feira, 24 de junho de 2011

Absurdus, Hardcore


Hoje acordei
depois de uma noite acompanhado de mosquitos e herméticos sonhos que vão além da minha compreensão
Não!
É a realidade irmão...

O denso dia avança para futuro,
o céu é cinza,
o vento transforma a suave dança da fumaça do incenso,
em movimentos Hardcore.

É meio-dia,
o tempo é preenchido
pela sinfonia de uma panela de pressão,
gemidos de uma vizinha em orgasmos,
pedaços do reboco pelo chão.

Na minha paisagem emoldurada,
edifícios vazios
cheios de pessoas anônimas
com suas loucuras,
solidões;
o mundo é um teatro do absurdo!

Hoje gostaria de matar
os idiotas e imbecis que conheço,
mas minha covardia apenas permite mais um poema;
entre poemas
meu fígado fica em conserva de álcool etílico.

Estou sozinho,
o espaço grita,
ouço ruídos pelos cantos,
saio de casa correndo...

Freud chamaria de neurose,
mas é apenas uma reposta para o que queima minha retina,
entope minhas narinas e reverbera em meus ouvidos.

Apesar deste péssimo dia,
encontro em meu caminho
os pássaros em cânticos
em uma árvore nua de outono.

Dissolvem-se assim,
O ódio,
Os ruídos e o desatino...

Poema e imagem: Rodrigo Vargas Souza

terça-feira, 21 de junho de 2011

JOSÉ


E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José ?
e agora, você ?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama protesta,
e agora, José ?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José ?
E agora, José ?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora ?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora ?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
Se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José !
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José !
José, pra onde ?

Poema: Carlos Drummond de Andrade
Imagem: Rodrigo V. Souza

Em breve nos melhores botecos de sua região

sábado, 11 de junho de 2011

Pele, cabelo, farelo e pentelho


Tudo que varro em minha casa é pedaço de mim,
Pelo,
Pele,
Cabelo,
Pentelho.
Tudo que varro em minha casa é pedaço de mim,
Vira poeira,
Passado.
Tudo que varro,
Cai de mim,
Alegria,
Tristeza,
Anarquia!
Tudo que varro de minha casa voa com o vento,
Farelo,
Pentelho,
Cabelo.
E depois de varrer tudo,
Ainda fica seco,
Grudado no chão,
Pus,
Lágrima,
Porra,
Cuspe,
Catarro.
E nas quinas,
Pelos cantos,
Pele,
Pentelho,
Cabelo,
Farelo.
Não importa a ordem,
Estão todos pela casa,
Como a tinta na tela de um quadro abstrato,
E tudo que não voa e não gruda no chão,
Eu mantenho vivo na alma,
Amor,
Arte,
Desejo e poesia (...)


Poema: Rodrigo
Imagem: Pollock

terça-feira, 7 de junho de 2011

Um poema contra Lênin, Papai Noel, Coelhinho da Páscoa e outras histórias fascistas


Mais um poema pedindo para sair,
De novo estou bebendo,
Sentindo-me pesado e inchado,
Escrevo, escrevo e falta poesia.
Torci para chover, pois o meu Tropicalismo é úmido e frio,
Vou fazer uma busca no Google das casas dos meus antepassados,
Malocas em ruínas luso-indígenas de pau e palha,
No deserto verde que na poeira do carroção deixei o meu sorriso de criança.
Sou Beat tupiniquim criado ao extremo sul do mundo,
Subtropicalista, não confunda com fascista,
Mas apreendi no livro do Caminhas como se faz a globalização maquiavélica.
A minha praia é o Intercionalismo libertário,
Não me restrinja em seu vocabulário,
Não me prenda em nenhum dogma católico!
Minha poesia é capenga,
E meu português errado,
Sid Vicious não era anarquista,
Não confunda com bagunça e com marca de skate.
Sou proletário,
Penso como um,
Contradigo-me, não tenho um pensamento formado,
Porém, não sou pão, não sou massa.
Sou meio, não pela metade, nem partido,
Mas não acredito em Lênin, Papai Noel e Coelhinho da Páscoa,
Só sei que não gosto deste mundo burguês dividido,
Como o objeto,
O objeto humano.
Vivo a flora e fauna,
Perdi-me na pontuação (...)
Insetos voadores,
Sem lenço e movimento,
Voto nulo,
Não me vendo e saio com minha bermuda rota,
Com meu pensamento perfumado de filosofia,
Penso em sexo (...)
Vou mijar e pegar outra cerveja,
O engraçado que nesse mundo é impossível não se contradizer,
Agora escrevo esse poema e o corretor do Word da Microsoft está assinalando o mijar
Clico em cima e lá vem a sugestão de urinar,
Não quero estar num contrato de compra e venda,
Por isto eu só penso em engendrar,
E pense o que quiser,
Eu engendro este poema,
Engendro em você a anarquia!

Poema: Rodrigo Vargas Souza
Imagem: Man Ray

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Poemas de Mário Faustino

ROMANCE

Para as Festas da Agonia
Vi-te chegar, como havia
Sonhando já que chegasses:
Vinha teu vulto tão belo
Em teu cavalo amarelo,
Anjo meu, que, se me amasses,
Em teu cavalo eu partira
Sem saudade, pena, ou ira;
Teu cavalo, que amarraras
Ao tronco de minha glória
E pastava-me a memória
Feno de ouro, gramas raras.
Era tão cálido o peito
Angélico, onde meu leito
Me deixaste então fazer,
Que pude esquecer a cor
Dos olhos da Vida e a dor
Que o Sono vinha trazer.
Tão celeste foi a Festa,
Tão fino o Anjo, e a Besta
Onde montei tão serena,
Que posso, Damas, dizer-vos
E a vós, Senhores, tão servos
De outra Festa mais terrena
Não morri de mala sorte,
Morri de amor pela Morte.

O SOM DESTA PAIXÃO ESGOTA A SEIVA

O som desta paixão esgota a seiva
Que ferve ao pé do torso; abole o gesto
De amor que suscitava torre e gruta,
Espada e chaga à luz do olhar blasfemo;
O som desta paixão expulsa a cor
Dos lábios da alegria e corta o passo
Ao gamo da aventura que fugia;
O som desta paixão desmente o verbo
Mais santo e mais preciso e enxuga a lágrima
Ao rosto suicida, anula o riso;
O som desta paixão detém o sol,
O som desta paixão apaga a lua.
O som desta paixão acende o fogo
Eterno que roubei, que te ilumina
A face zombeteira e me arruína.

O MÊS PRESENTE

Sinto que o mês presente se assassina,
As aves atuais nascem mudas
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre homens nus ao sul de luas curvas.
Sinto que o mês presente me assassina,
Corro despido atrás de cristo preso,
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda
Ao beco de agonia onde me espreita
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas
De apóstolos marujos que me arrastam
Ao longo da corrente onde blasfemas
Gaivotas provam peixes de milagre.
Sinto que o mês presente me assassina,
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
(Na libra escorpiões pesam-me a sina)
Há panos de imprimir a dura face
A força do suor de sangue e chaga.
Sinto que o mês presente me assassina,
Os derradeiros astros nascem tortos
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre o morto que enterra os próprios mortos.
O tempo na verdade tem domínio.
Amen, amen vos digo, tem domínio.
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.

SONETO

Necessito de um ser, um ser humano
Que me envolva de ser
Contra o não ser universal, arcano
Impossível de ler

À luz da lua que ressarce o dano
Cruel de adormecer
A sós, à noite, ao pé do desumano
Desejo de morrer.

Necessito de um ser, de seu abraço
Escuro e palpitante
Necessito de um ser dormente e lasso

Contra meu ser arfante:
Necessito de um ser sendo ao meu lado
Um ser profundo e aberto, um ser amado.

CARTA A VAN GOGH

Vincent a bala que perfurou seu peito rasgando sua carne me fez chorar por sua dor, você permaneceu sangrando até a chegada desesperada de Theo, talvez ainda não compreenda os motivos, talvez percorra também os mesmos labirintos da alma que o impulsionaram, mas já posso afirmar que aceito sua decisão de dar um basta neste fazer sofrer, como você mesmo falou: a “miséria não acabará jamais”.
Só você é capaz de nos relatar esta monumental força que mora em seu peito, nos oferta a luz liberta o movimento e ao mesmo tempo o mergulha nas sombras obscuras de gênero humano, seria este o motivo do alvo?
Apoteótica é sua arte, mas de antemão sei que sua função é apenas distrair os dissabores permanentes, me faz lembrar a canção que dizia que viver é melhor que sonhar, eu sei que o amor é uma coisa boa, mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa, hoje vivemos dias de total indiferença de total alienação, o fenômeno transformador do fazer artístico ainda provoca reações, mas esta absorvido por um mercado ávido por inovações.Sabemos que os caminhos da arte para aqueles que lhe dedicam o melhor
de sua capacidade é tortuoso e íngreme, a redenção está no seu exercício, em permanecer o maior tempo possível na sua presença, mas existir no tempo e no espaço cobra suas viscosidades, por isso não te questiono, me preocupa o fato do imenso vazio que sua ausência nos causa.Amigo, você e tantos outros que contribuem para que a humanidade avance em busca de si mesma deveriam ficar mais tempo junto a nós, são seres imprescindíveis, pena mesmo que esta intangível força acabe por nos apartar, então, fica a obra vai o artista, fica a memória sucumbe o homem, mas para os que permanecem sua energia nos impulsiona mais e mais, me permito afirmar que mesmo na dor vale o sacrifício, o objetivo se cumpriu, a luz finalmente atingiu o olhar
dos que tocados por seu calor e sensibilidade aceitam de bom grado cumprir os ditames da arte, do humano, do sensível, do fundamental e inadiável efeito do espírito criador que nos move velozes, ansiosos por atingir o topo e vislumbrar o horizonte, obrigado Vincent por sua capacidade incontida, por seu exemplo, que esteja confortável em seu campo sideral, ainda caminharemos lado a lado, até...

Texto: André Soares
Imagem: V. Gogh

Livre



'' Deixo meu sutien pendurado
meu baton vermelho guardado
e visto uma nova roupa e ponho uma nova cara (...)
E saio deixando meu lugar,um lugar que não é meu
e ponho a mostra um corpo,que não pertence a mim
pertence a fatores externos,contra minha naturalidade

andar descalço é rude
preciso por meu salto alto,para me elevar,ainda não sei aonde(...)

Carrego comigo minha bolsa de couro marrom
escondendo meus mistérios,meus cartões,meus recibos
meus valores (...)
Na minha cintura acorrenta-se um cinto de metal,cuja qualquer silhueta fica fora de um modelo natural,mas o folder me diz que é legal !
Adornos
anéis
relógios,lenços,mantas,luvas
me lembram de tirar a sombrancelha (...) conforme o contorno do meu rosto,é claro!
Preciso usar sempre preto,pois isso me deixa elegante e emagrece....sempre em alta
mas meus pêlos precisam crescer(...)
Meus pés querem andar descalços
minhas unhas não querem cor
meu corpo não quer se prender
e assim sai da garganta um grito por ser livre num mundo que diariamente te diz o que vestir,o que calçar,que cores usar(...)
A moda não embeleza,escraviza!
Temos direito a diferença ,quando a igualdade nos descaracteriza!

Texto: Emm@
Imagem: John Heartfield